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"Uma tragédia dentro de outra tragédia" - o sismo que deixou milhões sem nada

Primeiro veio a guerra civil na Síria que obrigou a família de Hind Qayduha a fugir da sua casa para Aleppo. Depois, o conflito e as condições em que se encontravam obrigaram-nos a fugir mais duas vezes, até que há dois anos atrás, finalmente encontraram na Turquia a segurança e a estabilidade que tanto procuravam.

Até que dois poderosos sismos (dos mais intensos a assolar a região em 100 anos), de magnitudes de 7.7 e de 7.5, causaram a perda de milhares de vidas e uma destruição incalculável, nas regiões da fronteira da Turquia com a Síria, que ainda permanecem em alerta devido aos contínuos novos abalos.

Como milhares de infraestruturas, o apartamento da família foi totalmente destruído. Foram forçados, como tantos outros sobreviventes, a ficar ao relento, em tendas improvisadas, perto das montanhas, suportando as baixas temperaturas.

Hind Qayduha e a sua família num abrigo improvisado, após o sismo ter destruído a sua casa. Emily Garthwaite/NYT

Para a família Qayduha, assim como para tantos outros refugiados, esta é uma tragédia dentro de outra tragédia. Infelizmente, já conhecem demasiado bem o que é perder uma casa, familiares e amigos. Há mais de 12 anos que sofrem com as consequências de uma guerra sangrenta, que deixou mais de 300 mil mortos e que forçou mais de 12 milhões de pessoas a fugirem, sendo que metade destas ainda permanecem na Síria. Muitas outras conseguiram encontrar (o que esperavam ser) um porto de abrigo, ao fugir para a Turquia que é o país com o maior número de refugiados do mundo, contando atualmente com cerca de 3.7 milhões, sendo a grande maioria da Síria.

Além da intensificação das dificuldades, das deportações e da discriminação sentidas nos últimos tempos, os refugiados sírios (re)vivem agora mais uma tragédia, que para muitos ainda é dificilmente chocante para compreender. Conseguiram sobreviver a bombas, balas, gás e tantos outros ataques mas esta catástrofe, como nunca antes, deixou-os sem nada e sem nenhum sítio para ir. Milhares perderam tudo e muitos admitem não saber como reconstruir as suas vidas mais uma vez.

Esta tragédia surge num momento tenso entre os dois povos, com a opinião pública turca a virar-se contra os sírios, culpando-os dos males do país. Prevê-se que depois destes terramotos e com as eleições de maio à porta, esta situação apenas vá piorar. Ainda que alguns turcos se virem agora contra os refugiados sírios, impedindo-os de receber ajuda, a solidariedade ainda existe na catástrofe, onde todos perdem e todos se tentam salvar.

Na Síria, a situação é aterradora, com a permanência da guerra civil, a falta de condições e a dificuldade para as equipas de emergência entrarem nas zonas afetadas. Estima-se que mais de 5 milhões de pessoas ficaram desalojadas, somando-se aos já 6.8 milhões de pessoas que estão deslocadas dentro do país por causa da guerra. A maioria das partes afetadas pelo sismo são governadas por forças rebeldes ao regime, estando o seu acesso bloqueado. Só agora, que o governo sírio permitiu entrarem, é que começa a ser possível perceber a verdadeira escala da destruição.

Até ao momento, mais de 41 mil pessoas morreram e milhares de cadáveres permanecem sob os escombros destes sismos. No meio da destruição ainda se procuram familiares, amigos, conhecidos ou qualquer sinal de vida. A esperança ou a dor, levam alguns a recusarem-se a sair das cidades afetadas, sobrevivendo sem qualquer teto que os proteja, eletricidade, água ou aquecimento. Sem equipas de resgate suficientes, as próprias vítimas permanecem perto dos corpos dos seus entes queridos e muitos prontificam-se a retirar quaisquer corpos que encontrem. Esta é uma crise de proporções colossais, dentro de outras crises e que levará décadas para recuperar.


Para ajudar as equipas de emergência a garantir a ação e o apoio necessários, pode fazer doações para as várias instituições no terreno, como: Capacetes Brancos (White Helmets); UNICEF; Portugal com ACNUR; IRC; Médicos do Mundo; AMI; Cruz Vermelha/Crescente Vermelho; e tantas outras.


Casal sírio carrega os seus únicos pertences em Elbistan, na Turquia. Mehmet Kacmaz/Getty Images

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