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12 anos de guerra na Síria, sem fim à vista

"Antes da guerra, eu não sabia sequer o que era a polícia. Não entendia a violência. Eu tinha 12 anos e, de um momento para o outro, passei a ter 18 ou 20. Senti que me tornei adulta num piscar de olhos. A guerra fez-me muito mais velha de repente. Não havia forma de brincar, de estudar, de crescer." Gufran tem agora 24 anos e recorda o horror que viveu "era só fugir de um sítio para o outro. Só sangue, só mortos, só choro e gritos, só coisas que não é suposto uma criança ver." Como Gufran muitos milhões de pessoas viveram a barbaridade de uma guerra que ninguém previa acontecer.

Foi em março de 2011 que a violência escalou, quando as forças lideradas pelo governo de Bashar al-Assad atacaram violentamente milhares de manifestantes que exigiam a demissão do presidente. Centenas de dissidentes e opositores foram assassinados e detidos nos dias seguintes, aumentando a violenta repressão do regime. A oposição respondeu com armas, para retirar as forças de segurança das suas áreas. Depressa a violência escalou numa guerra civil que atraiu centenas de grupos rebeldes da região, tornando-a num conflito com muito mais significado do que apenas um confronto entre o regime no poder e os seus opositores. A entrada dos poderes internacionais em cena, só piorou o caos, levando a que grupos extremistas como a al-Qaeda e o auto-proclamado Estado Islâmico também se envolvessem, resultando numa guerra por procuração.

Atualmente a guerra é levada a cabo por várias facções incluindo unidades de civis, grupos nacionalistas, independentistas, rebeldes, extremistas e forças internacionais. Apesar do atenuar da violência, a guerra na Síria é para o enviado especial da ONU Geir Pedersen "uma profunda crise humanitária, politica, militar, securitária, economica e dos direitos humanos, de grande complexidade numa escala quase inimaginavel". Estima-se que cerca de 503 mil pessoas tenham morrido como resultado de operações militares, não incluindo os milhares que morreram por tortura ou falta de acesso a cuidados de saúde, a comida ou água e outros direitos humanos essenciais.

Mais de 22 milhões de pessoas foram forçadas a fugir, com cerca de 6.9 milhões deslocados internos e 6.8 milhões de refugiados. A grande maioria permanece nos países vizinhos, com o Libano, a Jordânia e a Turquia a acolherem cerca de 5.3 milhões de sírios. As adversidades de receber fluxos massivos de pessoas vulneráveis são particularmente sentidas em países mais pequenos como o Líbano, em que 15% da sua população são sírios refugiados. Segundo a ONU 15.3 milhões de sírios (70% da população) necessitam de ajuda humanitária e 12 milhões vivem num estado de insegurança alimentar, não sabendo quando será a sua próxima refeição. A frágil situação da população síria e a imensa destruição do país agravaram-se com vários acontecimentos nos últimos anos, como a pandemia ou os terramotos devastadores no último fevereiro.

O reconhecimento da urgência de uma solução política é universal, mas não parece que o conflito termine tão rapidamente. Todas as rondas de negociação até agora falharam e Bashar al-Assad permanece fixado em não negociar nem deixar o cargo. Entretanto, milhões de pessoas continuam a sofrer, a viver em condições desumanas e a morrer à custa de fantasias magnânimas pela conquista de poder.

Agora, a Gufran, como muitos dos sírios acolhidos em Portugal, já consegue respirar de alívio, mas sublinha que ainda "há marcas do meu passado que não consigo deixar de trazer comigo, mas não quero ficar presa nelas". Vive em Braga e no futuro quer comprar uma casa perto da família que está em Braga, quer conseguir a cidadania portuguesa, melhorar o português e poder entrar na universidade. Para a Gufran, assim como para a maioria dos refugiados, o importante é que "temos que continuar a tentar, tentar, tentar, fazer, fazer, fazer. Andar sempre para a frente. (...) já recomecei a minha vida quatro, cinco vezes e não sei que mais voltas ela dará. Não faz mal, venha a próxima".

Mãe curda anda com a sua criança pelas ruas destruídas da cidade de Kobani, no distrito de Aleppo. Yasin Akgu. Getty Images.

Nota: os excertos da Gufran foram retirados do caderno Vozes de quem Caminha (Human Voices). Um projeto desenvolvido pela MEERU - Abrir Caminho. Conheça as outras histórias aqui.

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